Ressuscitar dentre os mortos

Ao descerem do monte (da transfiguração), ordenou-lhes Jesus que não divulgassem as coisas que tinham visto, até o dia em que o Filho do Homem ressuscitasse dentre os mortos. Eles guardaram a recomendação, perguntando uns aos outros que seria o ressuscitar dentre os mortos. Leiam Marcos 9.1-10
Transfiguração, Alexandr Ivanov em 1824
O calendário litúrgico nos recomenda celebrar nestes dias a transfiguração de Jesus diante dos seus mais chegados discípulos, o que representa para muitos teólogos uma antecipação em menor escala do que seria a ressurreição de Cristo, que se daria não muito tempo depois. Acontecimento único que a falta de visão da sua incomensurável dimensão fez com que Pedro, Tiago e João o tratassem como um evento particular, para o qual apenas eles três tinham sido convidados, e em favor do qual abririam mão do conforto pessoal e da companhia dos demais discípulos para poder eternizá-lo: Então, Pedro, tomando a palavra, disse: Mestre, bom é estarmos aqui e que façamos três tendas: uma será tua, outra, para Moisés, e outra, para Elias.

Embora fosse decepcionante aos olhos de todos os discípulos, esta não foi a única falha dos três. Eles também não se deram conta de que aquele momento não era a comemoração de uma conquista pessoal de Jesus ao se nivelar aos grandes heróis da história de Israel: Moisés e Elias. Mas que aquele era o prenúncio de uma vitória que extrapolaria a dimensão nacional para abranger todo o universo em todos os tempos. O próprio Jesus já os havia alertado para situações singulares como esta quando disse: (Mt 13.17) Pois em verdade vos digo que muitos profetas e justos desejaram ver o que vedes e não viram; e ouvir o que ouvis e não ouviram.

A questão a seguir que foi mais instigante, e que ainda instiga a muitos nos dias de hoje, é essa: que seria o ressuscitar dentre os mortos? Para o conhecimento pós-moderno existem três métodos de ressurreição: O método da preservação dos códigos de DNA, através da clonagem perfeita do gene do indivíduo, o que muitos acreditam já ser possível, e outros acreditam que já está sendo realizado. Em segundo lugar, o método da inteligência artificial, em que um algoritmo encriptaria todos os dados pessoais de uma pessoa falecida, de onde uma versão online dela seria criada. E, finalmente, o método religioso, que estaria acessível através de um sem número de religiões. Quanto a este último método, justamente o que poderia parecer ser o mais sobrenatural e raro, é nos dias de hoje o mais corriqueiro, pois não há um lugar sequer na face da terra em que não se encontre um ressuscitador ou uma ressuscitadora profissional, seja de que religião for.

Mas a ressurreição de Jesus, em particular, não trata simplesmente de fazer com que um ser cientificamente dado como morto retorne à vida. Não se trata da vitória de uma equipe médica ou do resultado do poder da fé de um xamã que tem a habilidade de manipular um dos mistérios mais profundos da humanidade. Trata-se de uma vitória irrestrita sobre qualquer tipo de morte, mesmo a mais difícil de ser vencida, pois ela anuncia a morte da própria morte.

Sem querer aqui ressaltar algo que já é grandioso em si mesmo, gostaria apenas de falar de alguns efeitos imediatos que esta ressurreição causou. O primeiro impacto foi a transformação de homens e mulheres que estavam escondidos, temendo pela própria vida, em intrépidos pregadores e testemunhas dessa ressurreição. Não mais apenas com palavras, mas com a entrega voluntária de tudo que possuíam, inclusive da própria vida, por algo que estaria acima de qualquer outra coisa. Em segundo lugar, a relativização da morte, onde esta deixa de ter a última palavra, e passa ser um ingresso a uma realidade maior e mais sublime. Depois com Paulo, a sua desvalorização total, onde a morte não é mais do que uma alternativa viável, e nem sempre a de maior peso: (Fp 1.21s) Porquanto, para mim, o viver é Cristo, e o morrer é lucro. Entretanto, se o viver na carne traz fruto para o meu trabalho, já não sei o que hei de escolher.

Se ainda não temos, assim como Pedro, Tiago e João, uma concepção mais concreta do que significa a ressurreição de Cristo, e isso em nada nos deprecia diante da grandeza do seu amor; tomemos como base a decisão segura dos antigos cristãos. A quem foi dado o maior de todos os galardões já conferido a um ser humano pelas Escrituras Sagradas: Homens e mulheres de quem o mundo não era, e ainda não é digno.

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