O que é ANGÚSTIA?

O filho pródigo entre porcos, Rembrandt em 1648
Distinta do medo, provocado por seres ou circunstâncias desse mundo, distinta do cuidado, que anseia por assistência particular, ou da preocupação excessiva a respeito de um trabalho ou de uma missão que está para ser cumprida, a angústia traz uma inquietação que brota das profundezas do eu, uma incerteza diante da morte ou do futuro em geral.  Na Bíblia, ao menos em sua tradução grega, este sentimento aparece no decurso de relatos que incluem algum termo específico, como por exemplo: Os que se encontram na agonia quanto ao resultado de um combate: Lc 22.44 - E, estando em agonia, orava mais intensamente. E aconteceu que o seu suor se tornou como gotas de sangue caindo sobre a terra. Perde-se o ânimo quando ocorre um impasse ou falta de uma saída: Lc 21.25s - Haverá sinais sobre a terra, angústia entre as nações; haverá homens que desmaiarão de terror; pois os poderes dos céus serão abalados.

O termo synechomai denota a ideia de estar bloqueado ou sequestrado, o indivíduo sente-se preso, encerrado ou dominado pelo temor. Lc 8.37 - Todo o povo dos gerasenos rogou-lhe que se retirasse deles, pois estavam possuídos de grande medo. Dominado por uma doença: Lc 4.38 - Ora, a sogra de Simão achava-se enferma, com febre muito alta; e rogaram-lhe por ela. Já stenochoria, que significar mergulhado na aflição ou oprimido: Dt 28.53 - Comerás o fruto do teu ventre, a carne de teus filhos e de tuas filhas, ...na angústia e no aperto com que os teus inimigos te apertarão.

Jacó, quando chega ao vale do Jaboc, se vê num impasse: Gn 32.7s - Então, Jacó teve medo e se perturbou; dividiu em dois bandos o povo que com ele estava, e os rebanhos, e os bois, e os camelos. Pois disse: Se vier Esaú a um bando e o ferir, o outro bando escapará. Diante do seu irmão Esaú ele enfrentará uma situação de angústia tão grande, que nem a sua luta com o anjo do Senhor pôde superar, mas nesta nova situação obteve a certeza de que Deus estava do seu lado.

Elias, quando deitado sob o zimbro, preferiu a morte ao desespero: IRs 19.4b - Basta; toma agora, ó SENHOR, a minha alma, pois não sou melhor do que meus pais. Julgando erradamente ser o último a não apostatar, considera o seu ministério profético um fracasso. Mas o anjo do Senhor o recolocaria de volta no caminho certo.

O povo inteiro está mergulhado nas trevas. Não estaria ele na stenochoria? Is 8.22 - Olharão para a terra, e eis aí angústia, escuridão e sombras de ansiedade, e serão lançados para densas trevas. Da mesma forma Jeremias perde o ânimo frente à calamidade pública. Jr 8.18 - Oh! Se eu pudesse consolar-me na minha tristeza! O meu coração desfalece dentro de mim.

Jó, tomado de medo, chora; se não acontece aquilo que ele espera a amargura lhe sobrevém; o temor de um deus barganhador o domina, até o dia em que se interrompe a obsessão pela salvação individual. É quando deixa de buscá-la e passa a crer que o justo espera em Deus a sua salvação.

No coração daquele que crê, a angústia pode ser experimentada em dois graus de profundidade. Primeiramente, a de Paulo ante a morte, quando temeu pela sua vida. Foi aí que passou a entender que nem mesmo a morte pode separá-lo do amor de Cristo. Passou a ter a certeza de que em Cristo a morte já está vencida, e que ela adquiriu um valor redentivo e útil ao Reino de Deus: II Co 4.12 – Em nós opera a morte, mas em vós a vida. Mas a angústia pode renascer em um nível mais profundo. Não mais pela própria vida ou pela salvação pessoal, mas diante da vida do próximo, da sua liberdade e da sua salvação. Não faz isso por altruísmo ou por obrigação, mas constrangido por um amor que excede a compreensão humana. Esta é uma angústia que nos oprimirá até o fim dos séculos, mas que pela fé pode ser sobrepujada, na certeza e na não certeza de um coração que abriga ao mesmo tempo o regozijo de um Reino que já está entre nós, e a angustiante espera da sua plenitude. 

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