A importância do Reino para Jesus III

Quanto, porém, aos covardes, aos incrédulos, aos abomináveis, aos assassinos, aos impuros, aos feiticeiros, aos idólatras e a todos os mentirosos, a parte que lhes cabe será no lago que arde com fogo e enxofre, a saber, a segunda morte. Apocalipse 21.8
As bodas de Caná, Tintoretto em 1561
Seriam as parábolas de Jesus histórias terrenas com um significado celestial? Esta é uma conclusão vaga e pouco lógica, pois não são todas as histórias as histórias que contamos, histórias terrenas? E que parte destas histórias podem ser creditadas como celestiais, a parte que fala do pecado ou a que fala da ação de Deus? Além disso, as nossas vidas são vividas na terra, quando chegarmos ao céu precisaremos de histórias celestes, mas agora, precisamos mesmo de uma história com um significado terreno. Descreia de imediato de quem vende mapas do caminho do céu, no céu ninguém precisará de mapas. Precisamos de mapas que realmente nos ajudem a atravessar o deserto. Estes mapas serão indicadores confiáveis, na medida em que forem sendo descobertos nas entrelinhas das parábolas do Reino.


Seriam as parábolas histórias para ilustrar a verdade? Talvez, mas devemos ter sempre em conta que ninguém, nem mesmo os discípulos, agarravam-se a todos os elementos das parábolas. Vejam a parábola dos trabalhadores da décima primeira hora. Nela o proprietário é livre para agir em sua infinita graça. Se por um lado destrói muitas expectativas, por outro dá muito mais do que é esperado. Sua liberdade não se limita a valores, e a sua graça não é uma questão de cálculo. Sem entrar na questão meritória, a parábola nos ensina que os seres humanos precisam compreender-se como inteiramente aceitos por Deus, independentemente das suas condições, e que sua existência não é uma questão de realização própria, conseguindo obter tudo o que deseja o coração, mas que é definida pelas prioridades do Reino.

Nas três parábolas de Lucas 15 sobre o perdido que é encontrado, Jesus afirma: Eu não vim chamar os justos, mas os pecadores. Observe que foi o tipo de pessoas mencionadas no início do capítulo que levou Jesus a contar estas parábolas. Vejam também que é uma mensagem de aceitação incondicional de Deus para com os seres humanos. Para Jesus, os cobradores de impostos e os pecadores nunca estarão irremediavelmente perdidos, por isso Jesus come com eles, por isso anda no meio deles.

No primeiro século da nossa eram as leis sobre a alimentação que ocupavam o centro da pregação e da moral judaica. Eram elas que determinavam, com maior peso, o grau de pureza ritual. Em Levítico 10:10 encontramos: Você é a distinção entre o santo e o profano e entre o imundo e o limpo. Neste contexto, o tipo de comunhão à mesa praticado por Jesus constituiu um ataque frontal aos fundamentos da distinção bíblica entre puros e impuros. A altura e a largura da aceitação amorosa do pai do pródigo é nova e inesperada, tanto para ele, que se achava perdido, quanto para o irmão mais velho. Pois este último não se entende aceito incondicionalmente, mas somente através da relação de retribuição por bom comportamento.

A análise da importância que o Reino de Deus tinha para Jesus, aqui ligeiramente esboçada e carecendo de meditação e pesquisas mais profundas, tem várias implicações importantes para o Cristianismo. Em primeiro lugar, constitui um aviso contra o capitalismo espiritual, esse mal invadiu a igreja e que orienta o nosso pensamento sobre o Reino. Uma análise segura vai nos propiciar uma eficiente defesa contra a mentalidade venal de uma doutrina que estimula investimento no Reino, não pela sua justiça, mas através de oferendas, que em última análise, nada tem de Cristianismo e muito tem de paganismo. Em segundo lugar, esta análise vai nos mostrar o perigoso caminho que lava a busca de bênçãos e retribuções comp promessas do Reino. Quando Jesus taxativamente advertiu sobre a nossa incompetência de fazer elocubrações sobre o fim dos tempos, ao mesmo tempo nos disse para não perdermos tempo tentando imaginar as bênçãos celestes de longo prazo, pois os olhos não viram, os ouvidos não ouviram e nem penetrou em coração humano algum o que Deus te preparado para os que o amam. A ação concreta em favor do Reino deve sempre tomar a forma do presente e ter em mente a necessidade do agora, se é que podemos assim definir o tempo do evangelho. O presente é feito de amor, e o amor, como disse Mestre Eckhart, é sem porquê.

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