Apaixonado por Deus

A minha alma anseia pelo Senhor mais do que os guardas pelo romper da manhã. Mais do que os guardas pelo romper da manhã, espere Israel no SENHOR. Leia Salmos 130
O Sentinela de Hazor, foto de Ferrell Jenkins
Texto do rev. Jonas Rezende.
Em seu livro Terra dos homens, Exupéry fala de um pequeno lago que mantinha estranho namoro com o oceano, do qual se encontrava separado por muitos quilômetros. O lago acompanhava periodicamente as marés distantes, como se estivesse realmente apaixonado pelo mar...

Neste salmo, em que o poeta liberta o clamor que sai das suas profundezas, eu também percebo um enamoramento com Deus, que gera uma ansiedade tão intensa quanto a que sentem os guardas pelo romper da manhã, término de sua angustiante vigília.

A Bíblia doa que devemos amar a Deus com toda alma, com todo entendimento e com todo o coração. Aqui o salmista deixa falar as emoções do coração em primeiro lugar. E produz uma página imortal.

Daniel Goleman nos ajuda a entender o papel da emoção na vida humana, até como bases para o desenvolvimento da nossa inteligência. Somos um feixe de emoções. Há 40 mil anos, um nosso ancestral já fazia música usando uma flauta rudimentar feita com o osso de um urso. Homero criava poemas ainda antes de contar com a escrita. O ser humano busca, desenvolve a intuição, é místico. A razão termina sendo apenas uma das vias do conhecimento. Nem sei se é a mais nobre.

Quem sabe se ainda não é mais profundo do que o pensamento, o enigma do mundo? Pergunta Fernando Pessoa. Quem sabe se ainda não é mais profundo do que o enigma do mundo, o mistério do amor? Sou eu que agora pergunto, diante do salmista e sua declaração de ternura a Deus. Essa devoção completamente apaixonada me parece mais bela do que o zelo furioso dos profetas, sem discordar da sua importância e da sua oportunidade. João da Cruz, o grande místico cristão, declarou certa vez: no fim, seremos julgados respeito do amor.

Veja agora que coisa mais bela, apesar de sofrida. O nosso grande compositor Antônia Maria, a despeito da grandeza da sua alma, foi preso durante a ditadura e teve as suas mãos, delicadas e artísticas, pisoteadas pela brutalidade dos torturadores. Na ocasião ele comentou sobre seus algozes: que bobos! Eles pensam que eu escrevo com as mãos.

O Saltério nos ensina a usar mais os nossos sentimentos e as nossas emoções, no encontro com Deus, o outro, o povo, a Natureza. Não podemos perder de vista a magia do Universo, a sabedoria das flores, como entendia Maurice Maeterlinck, que o nosso Monteiro Lobato o poeta-filósofo do indizível. A energia que dorme nas pedras. A grandiosidade das esferas celestes.

Se quisermos salvar a Natureza, que geme esperando a redenção, como lembra o apóstolo Paulo, não bastam discursos ecológicos. Temos que conhecê-la e amá-la. Faz muito tempo que perdemos o contato direto com a terra, o mar, os animais. E perdemos, em consequência, a relação amorosa com Deus, e com nosso irmão; perdemos a nós mesmos.

É o momento de ter saudade do Senhor, de reatar o enamoramento. É a oportunidade de sentir novamente angústia em face do seu silêncio e anelar pelo Senhor, mais do que os guardas pelo romper da manhã. Ele certamente corresponderá ao nosso amor. E nos ajudará na apropriação correta de todas as outras coisas, que nos serão oferecidas como um presente, que não mais nos faria falta.

Você pode apostar?

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