Onde é a tua igreja? II

Parábola do grão de mostarda, Van Gogh
Uma segunda intenção que se esconde por trás dessa pergunta é saber se a minha igreja pertence ao mundo real ou se é mais uma das abstrações apocalípticas com que certos cristãos imaginam ter comunhão. Esta é uma pergunta capciosa, cuja resposta pode de imediato excluir qualquer possibilidade de uma pessoa com escrúpulos e algum senso de indignação vir a por seus pés nela um dia. Essa pergunta se apresenta também como uma forma de triagem, da qual as pessoas se valem pela necessidade de determinar o grau de atenção e seriedade que nos serão dispensados dali para frente.

Não vamos nos iludir pensando que estes “evangélicos” que assim se apresentam constituem-se em mais um dos sinais flagrantes que nos apontam para o breve fim dos tempos. Eles ainda não são exatamente os tais espíritos enganadores que Paulo, Pedro, João Tiago e os profetas denunciaram com tanta veemência na Bíblia. Está na cara que eles só enganam a si mesmos e a alguns poucos mal intencionados.

No tempo de Jesus, o que mais se via nas praças e na periferia das cidades judaicas eram pessoas se autoproclamando Messias Salvadores de Israel. Este, embora não aponte para o Apocalipse, segundo a Bíblia, é um forte indício de que as coisas por aqui não andam nada bem, que autoridades constituídas não estão sendo honestas em seus governos, que não está se fazendo justiça aos necessitados e que a igreja não está exercendo a sua voz profética contra tudo o que está acontecendo. Não faz muito tempo, numa meditação chamada Cana quebrada, eu falei das diferentes lutas que são travadas em nosso mundo atual. Falei que a luta da igreja é diferente das lutas de classe que estamos acostumados a ver nas ruas e nas televisões. Mas não disse que a nossa luta pela implantação definitiva do Reino de Deus nos exclui da responsabilidade para com as pessoas que estão reivindicando um mundo melhor para todos.

Se alguém ainda nutre a ilusão de que Deus está preparando um mundo todo “zerado” para que os salvos vivam eternamente em glória, desista dela, porque o mundo que Deus amou com tal intensidade a ponto de entregar seu Filho Unigênito é esse aqui. Se existe uma igreja a qual Jesus amou e que por ela se entregou voluntariamente a ponto de fazer dela a sua noiva, esta igreja é a de pé no chão. Não são os tabernáculos dos santos eleitos e nem as hostes etéreas que mal tocam a superfície da Terra. Essas não precisam de um Cordeiro de Deus, e sim de um ser tão inatingível quanto elas.

A minha igreja, com certeza, não é a igreja de Deus, mesmo porque Deus não tem igreja. Ela não é a comunhão irrestrita dos santos. Se já foi um dia, deixou de ser no momento em que me filiei a ela. Por isso é importante que as pessoas conheçam Jesus pelo que ele representa na nossa fé. Diz assim um hino antigo:
Este nome leva sempre
Para bem te defender
Ele é arma ao teu alcance
Quando o mal te aparecer.

Não foi por mero acaso que Deus prescreveu entre os mandamentos um que fazia imperativa a proibição do uso indevido do seu nome. As manifestações humanas que levam o nome de Deus precisam ter a consciência do compromisso indissolúvel que têm com este nome. Quando nos apresentamos como pastores ou membros de uma igreja, e se existe por trás disso uma tentativa de alusão ao nome de Jesus, o Cristo, tenhamos a certeza de que não será o tamanho do templo ou do rol que dará credibilidade à nossa apresentação. Será sim o compromisso com a verdade do evangelho, que desde tempos remotíssimos nos tenta passar a realidade de um Reino que não é um tesouro a olhos vistos, mas que está escondido em algum lugar. Que nasce pequeno como um grão de mostarda, mas que pela sua presença e participação neste mundo vem a se tornar uma imensa árvore aonde as aves do céu vêm fazer os seus ninhos.

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