A eterna insatisfeita.

Vale a pena viver nessas condições?  Gênesis 25.20b
Encontro de Jacó e Esaú, Andrea Pozzo (1642-1709)
Pode não ser um grande discurso, mas estas foram as palavras proferidas por Rebeca em agradecimento pelo milagre que decretou o fim da sua esterilidade, fazendo com que ela gerasse não apenas um, mas dos dois filhos de Isaac, aquele que continuaria a saga do tão esperado herdeiro das promessas de Deus a Abraão. Não se contesta aqui o fato de ter sido uma gestação complicada, pois no útero de Rebeca já havia os sinais de que ela gestava dois bebês que seriam pais de duas nações que mais tarde seriam inimigas, mas desejar a morte, ou melhor, revelar a nulidade da vida por isso, demonstra que esta parcela de exagero revela a insatisfação perene em que Rebeca levava a sua vida.

Na Bíblia as pessoas são mostradas por inteiro, não fica escondido nem as mazelas dos heróis e nem as virtudes dos vilões. Por isso ela nos fez conhecer bem tanto a maldade de Sara para com Hagar e Ismael, como a fidelidade de Jezabel aos seus deuses. Por isso ela coloca na boca dos seus personagens frases que se eternizaram pelo seu valor inquestionável, como também outras tantas que nunca deveriam ter sido ditas. Nossa estimada Rebeca é a autora do versículo citado como texto base, que faz parte desses rol de frases que não acrescentaram absolutamente nada de bom ao seu currículo de esposa de um patriarca bíblico.

A sabedoria popular insiste sempre em afirmar que por trás de um grande homem há sempre uma grande mulher. Partindo da aceitação unânime deste ditado, perguntamos: Não poderia ter sido exatamente este um dos detalhes que transformou Isaac no menos expressivo dentre todos os patriarcas das Escrituras? Não seria a negatividade da mulher que colaborou para que o marido se tornasse o menos brilhante integrante do início da história da salvação?

A Bíblia revela também que estes patriarcas eram pessoas bem sucedidas, que possuíam bens suficientes para dar as suas esposas um conforto mais do que razoável para uma vida promissora. Revela mais ainda, que seus maridos, de uma forma ou de outra, manifestaram seu amor e fidelidade, numa época em que a mulher tinha que andar sobre o fio da navalha, era relacionada entre os bens materiais do marido e podia muito bem ser usada como moeda de troca. Ou seja, os homens que aceitaram sobre si o encargo de levar adiante as promessas de Deus, amavam suas mulheres apesar das suas rabugices, e consideravam que elas estavam muito acima de todos os seus bens materiais, fato que não era muito comum na Idade do Bronze.

Mas o problema causado pela insatisfação pessoal de Rebeca não foi apenas esse. Ele se manifestou também através de uma preferência indisfarçável e injusta por Jacó em detrimento do herdeiro por direito de nascimento, que era Esaú. Sua escolha equivocada fez com que um ladrão, trapaceiro e covarde assumisse a hereditariedade no lugar de um homem de caráter austero, e até onde se pôde concluir, íntegro. Suas artimanhas ludibriaram Isaac que já cego pela idade, não pode abençoar o filho a quem realmente cabia a bênção da primogenitura.

Isso, como causa imediata, decretou a fragmentação de toda a família. Colocou os irmãos em oposição e consequente risco de morte de um deles. Provocou a fuga apressada de Jacó para uma terra desconhecida e perigosa. Lançou ambos os filhos a um futuro incerto. Será que Rebeca avaliou os enormes riscos da sua manifestação absurda de insatisfação?

Não fosse a intervenção providencial de Deus, Rebeca poderia ter mudado tragicamente o rumo dessa história. Não fosse a graça de um Deus que se mantém fiel ao seu plano de salvação, Rebeca figuraria na Bíblia como um personagem nocivo e indesejável. Não fosse o amor de Deus, que está acima de todo egoísmo, nossas filhas hoje não receberiam o nome dessa mulher que levou a sua insatisfação acima da razão e dos valores familiares.

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