A gente somos inútel!

Qual de vós, tendo um servo ocupado na lavoura ou em guardar o gado, lhe dirá quando ele voltar do campo: Vem já e põe-te à mesa? E que, antes, não lhe diga: Prepara-me a ceia, cinge-te e serve-me, enquanto eu como e bebo; depois, comerás tu e beberás? Porventura, terá de agradecer ao servo porque este fez o que lhe havia ordenado? Lucas 17.7ss
A parábola do dez talentos, Willem Poorter (1608-1668)
Toda a lógica dessa resposta torna-se imediatamente ilógica quando o pedido que iniciou o diálogo é levado em conta. Nada há de mais coerente em um empregado cumprir com as funções para as quais foi contratado, mas o que isso tem a ver com o desejo oportuno dos discípulos ao pedir a Jesus para que lhes aumente a fé?
                                                      
Importante notar que antes do pedido ser feito, Jesus alerta os discípulos para que permaneçam sempre atentos quanto ao zelo com a conduta pessoal, e da compreensão devida às más condutas alheias. Ou seja, o cuidado para não pecar contra o próximo, e o perdão para o pecado do próximo. Duas faces de uma mesma moeda que está sempre girando em nossas vidas.

O elemento novo que parece complicar ainda mais o texto, na verdade abre uma janela para a apresentação de uma questão que não estava na pauta. Não era nenhuma novidade a ansiedade que os discípulos tinham quanto ao seu futuro no Reino que Jesus veio estabelecer. Para usar um termo da moda, eles queriam que Jesus traçasse com urgência um plano de cargos e salários. Eles queriam saber que tipo de recompensa receberiam por ter deixado toda uma vida para trás, e qual seriam as garantias futuras por estarem seguindo Jesus nesta empreitada de fé.  

Jesus mostra que, a despeito de todos eles terem sido chamados, a permanência no grupo era uma opção. Ninguém estava ali obrigado ou porque devia favores a Jesus. Ninguém é cristão por obrigação. Pode ser até que haja alguém que o seja por medo do inferno, mas por imposição não há uma pessoa sequer. Nossos pais podem ter nos arrastado para a igreja contra a nossa vontade, mas nunca tiveram a capacidade de decidir na escolha da nossa religião. Nesse ponto, a preocupação inicial dos discípulos se justificava, pois para ser cristão, principalmente no primeiro século, era preciso realmente ter muita fé.

Tudo isso nos leva a questão fundamental: o serviço. No Reino de Deus, servir não é uma opção, é uma consequência natural. O serviço é tão inerente à vida do cristão que não agrega qualquer mérito e que não se deve esperar qualquer agradecimento. Por mais que façamos, estaremos fazendo sempre aquém da justa medida do que realmente deveríamos de fato fazer, e por conta dessa falta devemos nos considerar servos inúteis.

O Ultraje a Rigor canta, através de uma letra engraçada, uma música que, dentre outras coisas, denuncia muito seriamente, no contexto brasileiro, a situação real do nosso descontexto, se é que existe essa palavra. O quanto a nossa própria vida é vivida em paralelo ao ideal de vida, ao que Jesus chamou de vida plena e abundante. O quanto as nossas preocupações são mesquinhas diante das necessidades do mundo. Na realidade atual da igreja esta música deveria ser cantada mais ou menos assim:

A gente ora, mas não sabe pedir.
A gente pede, mas não sabe esperar.
A gente lê a Bíblia, mas quer entender.
A gente vai louvar, mas só sabe cantar.
A gente dá o dízimo, mas quer 10 vezes mais.
A gente não quer mais pastor, mas animador de culto.
A gente quer a volta de Cristo,
Mas não nem sabe no que isso implica.

A gente somos inúteu!
E ainda queremos gratidão por isso,

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