O que é VERDADE? II

Juízo final, Michelangelo, em 1512
Para o apóstolo Paulo, a verdade continua apresentando alguns aspectos que os antigos ressaltavam. Usa a palavra para expressar sinceridade ou na expressão “dizer a verdade”, e isto está profundamente em acordo com a Bíblia hebraica no que diz respeito às promessas de Deus. Ele, porém, acrescenta que o sim derradeiro e definitivo a essas promessas é o Cristo que foi por nós crucificado. O comportamento que Paulo espera dos fiéis em Cristo não é outro senão retidão moral e justiça, que são marcas da verdade enfatizadas elos antigos escritores sacros. Tudo o que é verdade em Cristo é a
antítese das mentiras dos ídolos, não somente os ídolos pagãos, como também os que eram cultuados em Israel e os recém criados ídolos do Cristianismo, dos quais, ele, Paulo, tinha, expressamente contra sua vontade, se tornado um: Quando, pois, alguém diz: Eu sou de Paulo, e outro: Eu, de Apolo, não é evidente que andais segundo os homens? (ICo3,4) O verdadeiro Deus é o Deus vivo, com o qual se pode contar, e aquele que pela sua verdade salva o seu povo.

Nos evangelhos a verdade cristã assume uma oposição declarada à lei mosaica, não a invalidando ou negligenciando-a, mas sim dando a ela importância secundária. O que vale não é mais a verdade da lei, mas agora a verdade do evangelho, pois ela mais do que uma revelação, ela é o mistério de Deus que justifica o pecador sem que este precise ser fiel à antiga aliança, uma vez que Deus propiciou em Cristo uma aliança mais plena, mais abrangente e mais consistente com a sua verdade. A fidelidade não se expressa mais pelo cumprimento do rigor da lei, mas por algo que vai além da lei, que é a aceitação da verdade do evangelho. Chegar ao conhecimento da verdade torna-se, então, abraçar o evangelho e aceitar o senhorio de Cristo, que é onde se consuma a fé cristã.

As epístolas católicas nos dão conta de que os crentes em Cristo são gerados para uma vida nova através da verdade, e que somente pela verdade podem ser alimentados com vista ao crescimento na fé: Despojando-vos, portanto, de toda maldade e dolo, de hipocrisias e invejas e de toda sorte de maledicências, desejai ardentemente, como crianças recém-nascidas, o genuíno leite espiritual, para que, por ele, vos seja dado crescimento para salvação. Aqueles genuinamente gerados na verdade tem o poder ou capacidade de confrontar os doutores da mentira, como também aqueles que para benefício próprio lhe voltaram a costas e se erguem contra ela: Pois entre estes se encontram os que penetram sorrateiramente nas casas e conseguem cativar mulherinhas sobrecarregadas de pecados, conduzidas de várias paixões, que aprendem sempre e jamais podem chegar ao conhecimento da verdade. (II Tm 3.6s)

O duelo entre a sã doutrina e o erro é incansável, não terminou com a paixão, morte e ressurreição de Cristo, mas continua através do Espírito da Verdade que veio para testemunhar e confirmar a obra dele. O Espírito de Deus não é um espírito de confusão, nem de baderna, mas de paz e esperança: Ora, a esperança não confunde, porque o amor de Deus é derramado em nosso coração pelo Espírito Santo, que nos foi outorgado. (Rm 5.5)

Enfim, a verdade para o cristão não é o domínio pleno do ser ou das atitudes que necessitamos confirmar com todo esforço e determinação. Ela vem para nós como um presente de Deus em Cristo que é iluminado pelo Espírito. Não é nunca uma questão de mérito ou de conquista, mas de aceitação pela fé simples e descomplicada que transforma de vez a nossa existência. A verdade da salvação antes autenticamente anunciada nos livros sagrados resplandece para nós na pessoa de Cristo, que ao mesmo tempo é o nosso mediador diante de Deus, quando essa verdade não é plenamente aceita por nós. A verdade atua em nosso meio com vistas a uma salvação futura que seja a irrestrita a todos os homens e extensível à natureza. Mas que atua aqui e agora quebrando os grilhões escravizantes da mentira: Conhecereis a verdade e a verdade vos libertará. (Jo 8.32)

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