Telêmetros da fé

Não ensinará jamais cada um ao seu próximo, nem cada um ao seu irmão, dizendo: Conhece ao Senhor, porque todos me conhecerão, desde o menor até ao maior deles, diz o Senhor. Jr 31,34a
Paulo ensinando em Atenas, Raffaello, em 1515
Já tivemos a oportunidade de meditar sobre o conhecimento de Deus algumas vezes aqui neste blog, e o fizemos particularmente no post Conhecimento, que falta faz, contudo, na ocasião não nos demos conta de que ele é o telêmetro que mede o quanto estamos distantes do Reino de Deus. A despeito de muitos afirmarem que os sinais do fim dos tempos são mais acentuados hoje do que em qualquer outro período da História, o que invariavelmente todas as gerações a partir da ressurreição de Cristo tem feito, o conhecimento de Deus é o parâmetro que os profetas, tanto do Primeiro quanto do Segundo Testamentos, usaram para aferir esta distância no tempo. Se há um consenso no contexto bíblico é aquele que evoca como fator primordial para a consumação do Reino a obsolescência do ensino, porque, como diz o nosso texto, todos conhecerão a Deus em igualdade de condições, porque ele será tudo em todos.


Mais tarde, o expoente máximo da cultura e do ensinamento cristão viria a afirmar em seu texto mais conhecido: Havendo ciência, passará, porque em parte conhecemos,... mas quando vier o que é perfeito, tudo que é em parte será aniquilado. (ICo 13.8b,9a e 10). Ao pensar nestas palavras me vejo na obrigação de traduzi-las para as circunstâncias atuais da condição humana, no entanto, ainda não consegui encontrar um paralelo, ainda que utópico, para equiparar esta realidade incontestável da Bíblia. Fico tentando imaginar uma forma de responder a estas perguntas: Que tipo de conhecimento seria suficientemente pleno e inteligível de modo a alcançar e ser absorvido por crianças e adultos indistinta e indiscriminavelmente? Que linguagem este conhecimento usaria para transpor barreiras culturais, regionais, econômicas e religiosas?

Alguns acréscimos das Cartas aos Coríntios 13 são muito bem vindos, como por exemplo, a bênção apostólica registrada em IICo 13,13, podem contribuir com bastantes indícios para nos dar uma resposta, ainda que superficial, a estas questões. Um deles suplica que o amor de Deus guarde os nossos corações no conhecimento da verdade. Quando se ouve isso pode-se muito bem concluir que a verdade estaria no primeiro plano para se alcançar o conhecimento pleno, mas não é bem assim. Primeiramente precisamos rever o conceito de verdade na Bíblia, que é totalmente diferente do nosso. Para nós, a verdade é a declaração fidedigna da realidade dos fatos, a exposição absolutamente fiel do acontecimento ou circunstância. Pode ser para nós, mas para a Bíblia não é. A verdade da Bíblia pouco tem a ver com a realidade, aliás, ela diz exatamente o contrário, ela diz que o que vemos não é o real, mas sim o prenúncio de uma realidade infinitamente maior que só pode ser vista com olhos da fé. O caminho do conhecimento bíblico passa pela confiança irrestrita em um Deus que pode fazer muito mais do que possamos um dia vir a imaginar ser possível. É esta verdade que Paulo recomenda a uma igreja que esta sendo assolada por divisões sociais, doutrinas pagãs, falso moralismo, disputas de poder e soberba religiosa. Este é um dado que indica que tantos os coríntios no passado quanto nós hoje estamos distantes do conhecimento ideal.

O segundo indício fala que a presença do Espírito Santo deve estar entre nós. Pode parecer que estamos fazendo chover no mar, diante de tantas declarações da presença desse Espírito em todos os segmentos, atribuições e atitudes da igreja nos dias de hoje. Mais uma vez digo que não é bem assim. Muito mais do que exaltar a presença do Espírito em nosso meio, o texto quer dizer que o Espírito Santo deve ser o único elemento que pode se interpor entre mim e o meu próximo. Talvez a conduta mais aviltante a este conceito, em particular, esteja embutida na pretensão “vou liberar uma unção poderosa”. Não tenho espaço neste blog para detalhar as inúmeras heresias contidas nestas poucas palavras, como também confesso não saber qual é a maior delas. Mas, no que diz respeito ao assunto da postagem, destaco a arrogante ilusão de nos colocarmos como os últimos bastiões entre o próximo e a sua salvação. Esta é a confirmação mais evidente de que não é o Espírito Santo que está entre nós, e sim nós entre o Espírito e as demais pessoas. Da forma como entendo a expressão supracitada, entre o “liberador” e qualquer outro cristão que não detenha o poder de reter ou liberar as bênçãos que são concedidas, sem medida, pelo Espírito de Deus.

Enquanto houver mais gente ensinando do que aprendendo, enquanto houver mais gente profetizando do que obedecendo, enquanto houver mais gente se colocando no lugar do que a serviço do Espírito Santo, vamos olhar o relógio do tempo de Deus batendo mais devagar e marcando cada vez mais desilusões na vida cristã

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