A Reforma Wesleyana do século XVIII

Mural da Fac. Teologia de São Paulo, Marcos Brescovici (1967-)
Texto do rev. Duncan A. Reily
Em 1744, João Wesley e nove dos seus colaboradores, todos anglicanos, se reuniram para descobrir o propósito de Deus em levantar o metodismo.  Depois de muita oração, concluíram que Deus os chamava para “reformar o país e, em particular, a Igreja e espalhar a santidade bíblica por toda a terra”. A obra teria embasamento numa atualização e ampliação das grandes doutrinas da Reforma de Lutero, buscando aplicar as boas novas à situação social da época.

Segundo o historiador H. O. Wakeman, a Igreja da Inglaterra começou a perder o seu vigor no tempo dos reis William. Em seu livro Introduction Introdução à História da Igreja na Inglaterra, ele diz que “quando os sinos dobraram em 1714 para saudar a entronização de William I, eles anunciaram a morte dos seus altos ideais e vida vigorosa por mais de meio século”. Outrora vigorosas, as denominações oriundas do puritanismo (congregacionais, presbiterianas e batistas) foram enfraquecidas pela imposição de uma única forma de culto. Esse enfraquecimento se intensificou com o crescimento do socinianismo (unitarismo) no meio das igrejas. Em resumo, o cristianismo inglês no século XVIII estava em profunda decadência, carecendo de uma nova reforma. Foi nesse cenário que João Wesley reafirmou os grandes princípios da Reforma Protestante do século XVI no seu ensino, pregação e vivência, trazendo verdadeira renovação ao cristianismo britânico.

A JUSTIFICAÇÃO PELA FÉ
Conhecida como a experiência do “coração quente”, a experiência religiosa de João Wesley,  acontecida em Londres, na noite de 24 de maio de 1738, pode dar a ideia de apenas um momento de forte emoção. Felizmente, ele deixou para a posteridade uma sucinta autobiografia espiritual, na qual a descrição de sua experiência, longe de limitar-se ao que ele sentiu, é uma análise racional, de surpreendente densidade teológica.

No parágrafo 14 da autobiografia, Wesley esclarece os pontos básicos da sua fé evangélica. Ele defende que fé, mais do que crença, é confiança em Cristo e que o pecador arrependido que recebe o dom da fé é perdoado de seus pecados. Afirma que a pessoa, tendo recebido o dom da fé e o perdão dos pecados, muitas vezes recebe a certeza deste perdão em seu próprio coração.

Ainda no gozo daquela paz com Deus que acompanha a certeza do perdão e a adoção como filho, João Wesley começa a compartilhar sua nova fé entre amigos, nas sociedades religiosas e, quando possível, nas igrejas. Inesperadamente convidado por Jorge Whitefield, Wesley começa a proclamar a boa nova a multidões ao ar livre. Um de seus textos favoritos para essas pregações era: “Arrependeivos e crede no Evangelho”. Foi para pessoas no estado espiritual de arrependimento que ele organizou as “sociedades”. Foi para os arrependidos que ele criou as “Regras Gerais”:
 (1) evitar o mal e
 (2) praticar o bem.

Aqueles que recebiam e testemunhavam sua fé pessoal em Jesus eram encorajados ao crescimento na graça e à perfeição no amor. Wesley cria que o mandamento: “Sede vós perfeitos” (Mt 5.48) e o urgente convite: “prossigamos até a perfeição” (Hb 6.1) tinham que ser levados a sério. Para ele, a perfeição cristã era a perfeição em amor, e o amor é sempre atuante. Por isso, não havia conflito nem distanciamento entre a evangelização e a ação social, como freqüentemente acontece hoje. Wesley se preocupava com a situação dos pobres. Ele estabeleceu um modesto fundo de empréstimos para pessoas que desejassem começar uma empresa familiar ou pagar uma dívida urgente. Para os doentes, fundou um ambulatório e compilou um livro de remédios caseiros. Procurou também atacar as causas da pobreza. Como exemplo, cita-se seu apoio à obra de alfabetização de Roberto Raikes. Além disso, direta ou indiretamente, a Reforma  Metodista participaria da reforma penitenciária, bem como do movimento de abolição do tráfico de escravos.

Poucos dias antes de sua morte (24 de fevereiro de 1791), Wesley escreveu a William Wilberforce, encorajando-o a não abandonar a luta contra a escravidão. E essa carta teve êxito! Assim, a obra evangelística de Wesley se completou com sua obra social de largo e duradouro impacto. (continua)

Duncan A. Reily foi doutor em história da igreja pela Emory University, em Atlanta, Geórgia, ex-professor da Universidade Metodista de São Paulo e autor de História Documental do Protestantismo no Brasil. (1924-2004).

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