Pastor por excelência, amigo por vocação

Reverendo Ferdinando Pereira Coelho em 1980
Faleceu no último domingo o rev. Ferdinando Pereira Coelho, pastor metodista, homem de Deus, servo da igreja, líder dos jovens e paixão dos idosos. Transcrevo essas suas qualidades convicto de que não são suficientemente capazes de descrever o seu irretocável ministério pastoral, como tampouco confirmar a inequívoca vocação daquele que foi um apascentador de ovelhas, sem deixar de ser um pescador de homens.


Assim como me faltam adjetivos, me sobram lembranças deste que foi um amigo nem sempre por mim compreendido, mas sempre fiel e amoroso. Seu chamado para o ministério se deu numa das horas mais imprópria da sua vida na igreja. Justamente quando galgou o cargo de despachante aduaneiro, função que na época rendia e ainda rende excelentes salários. Ferdinando, que fora criado na Igreja Metodista de Cascadura, sempre foi um membro ativo, principalmente na Sociedade de Jovens, sendo seu presidente por vários e gloriosos anos. Não havia nada de errado na sua trajetória com membro leigo. Por isso creio firmemente que seu chamado se deu simplesmente por iluminação, e não por qualquer incidente traumático ou doloroso que o tenha marcado.

Sei que é bem que é difícil compreender hoje em dia, mas o rev. Ferdinando entrou no ministério pastoral para perder, e perdeu muito. Basta dizer que o seu primeiro provento como pastor foi bem inferior ao dízimo que havia dado no mês anterior como membro leigo. Até hoje me pergunto o que de tão extraordinário aconteceu nesse chamado que foi capaz de transtornar radicalmente a vida financeira de uma família e continuar sendo recebido, por longas décadas, como uma inominável bênção. O amigo comum, João Wesley, dizia sempre: Ferdinando foi fiel no muito.

Ferdinando foi um pastor metodista que nunca se rendeu às inovações neopentecostais que a liderança lhe impusera, embora fosse um místico que confiava plenamente no poder da oração. Nunca foi flagrado fazendo as mirabolantes coreografias da fé, e nem taxando a retribuição financeira como parâmetro para seguimento do evangelho. A firmeza o que mantinha na sã doutrina também lhe permitia ser flexível em muitos outros aspectos. Era bem capaz de sair de uma pelada com a garotada, e com o mesmo humor e o mesmo espírito dirigir uma reunião importante. Posso garantir que para minha mãe, foi o pastor por excelência. Mesmo longe, ela mantinha contato. Nem mudando para Aracaju, quando já aposentado e respondendo sim a mais um desafio do ministério, se viu livre dela, pois por mais de uma oportunidade foi visitá-lo.

Assim transcreveu no Facebook uma hoje senhora, que era bem jovem quando Ferdinando foi seu pastor: Esteve sempre disponível pra me ouvir. Foi com ele que desabafei sobre as minhas primeiras desilusões amorosas, aos 17 anos. Com ele, dividi muitos sonhos, medos e frustrações comuns, aos jovens daquela época. Saudades do seu bom humor, da sua sabedoria carregada de verdade e simplicidade. O meu querido pai/pastor sempre acreditou no potencial da juventude e não mediu esforços pra investir em cada um de nós! Homem corajoso!

Também tenho saudades do velho amigo. De como gostava de vê-lo cantar com entusiasmo e demonstrar com a própria vida que não era dos fortes a vitória e nem dos que correm melhor. De como sempre mostrou, a exemplo de seu Mestre, cuidado e amor sem igual. A sua ausência pode ser doída, pode trazer lembranças, me fazer vivenciar as minhas negligências. Mas tenho certeza absoluta que nada vai superar a carência daquilo que mais sinto falta e que não tenho mais qualquer esperança de um dia suprir.

Há mais ou menos dois anos, quando estive com o casal Ferdinando e sua fidelíssima escudeira e mentora, Acerilda, recebi deles um abraço que me fez chorar copiosamente. Eu não conseguia entender o motivo daquelas lágrimas. Não era tanto pela saudade, pela distância ou mesmo pelo tempo que não nos víamos. Não era também pela manifestação de alegria ao nos ver, o que poderia me causar, como causou, enorme comoção, mas não causaria tantas lágrimas. Foi quando me dei conta de que não recebia um abraço pastoral como aquele há muito tempo. Fazia anos que braços de amor sem interesse me envolviam. Que emoção foi aquela dominou meu consciente e meu inconsciente? Não sei. Só sei que depois do pastorado de Ferdinando nunca mais consegui confiar a um pastor as minhas carências sem que estas fossem usadas contra mim mais tarde. Nunca mais o fato de ser pastor foi para mim motivo de confiança irrestrita, amor sem medida e compreensão além da razão.

Ferdinando, eu chorei naquele dia, chorei ontem no seu sepultamento, e sei que vou continuar chorando até o dia da minha partida, porque pastor como você, jamais serei. Pastor como você, nunca mais terei.

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