O mistério que salva o pecador III

Madalena na casa do fariseu, Jean Béraud (1849-1935)
Leia Lucas 7, 36-50

Outro fato incontestável é que o amor de Deus nos leva ao arrependimento. Nós sempre pensamos que é o contrário, que o arrependimento é que nos leva ao perdão de Deus. Vejam a mulher do texto, ela foi a Jesus e fez o que fez porque ela já estava
perdoada. Jesus não a perdoou porque ela demonstrou amor, como pensavam aquelas pessoas à mesa. Ele simplesmente declarou que ela já estava perdoada. Vejam o que diz o versículo 47 deste texto: Eu afirmo a você, então, que o grande amor que ela mostrou prova que os seus muitos pecados já foram perdoados. Jesus declarou um fato que já estava consumado antes mesmo daquela mulher chegar à casa de Simão. Ela já estava aceita, o perdão de Deus criou o arrependimento e não o contrário. Esta é a resposta divina à grande pergunta da nossa existência. Por que Deus nos ama tanto?

Perdão é participação, perdão é envolvimento, por isso o perdão torna possível o amor. Realmente nós só podemos amar se aceitarmos o perdão, ninguém pode amar quando se sente rejeitado. Quanto maior a necessidade de perdão, tanto maior será o nosso amor quando o alcançamos. Mas como igreja agimos na contramão deste fato. Tanto as nossas campanhas de evangelização como até mesmo a nossa filosofia de evangelização individual jogam incontestavelmente contra este fato. Quando saímos para evangelizar, saímos para criar nas pessoas um senso de rejeição. Você é pecador. Você vai ser castigado. Você vai para o Inferno. Fazemos este terrorismo espiritual achando que se a pessoa se achar suficientemente rejeitada ela é capaz de se arrepender, de voltar atrás e passar a amar a Deus. Mas não é assim que funciona, ou pelo menos, com a maioria das pessoas não tem funcionado assim. Jesus nunca fez isso uma vez sequer em todo o seu ministério. Como homem, ele aprendeu que ninguém pode amar a Deus quando se sente rejeitado por ele, e como Deus, nunca havia experimentado o amor de quem não se sentia amado. Esse é o grande problema do nosso sistema penitenciário. Enquanto o preso se sentir rejeitado pela nossa sociedade, nunca poderemos esperar dele uma resposta de amor para conosco.

Nós temos aprendido e ensinado uma teologia para os bons e justos, principalmente nós, os protestantes. Não há nada de errado em ser bom e justo. O problema é que a nossa retidão é dura, rígida e inflexível. Mas ainda assim, mesmo aquele que se sente justo, sabe que necessita do perdão de Deus, mas sabe também que não precisa tanto, ou numa dose tão elevada quanto a prostituta ou quanto as pessoas de má conduta ou má fama. Fica claro nessa história é que os justos nada poderiam fazer por aquela mulher, a não ser deixá-la à margem, a não ser rejeitá-la, como eles queriam que Jesus tivesse feito. Aquela mulher, que viveu a sua vida atormentada pelo pecado, estava buscando o que encontrou em Jesus: um amor que não impusesse condições, que não ditasse regras de conduta, e que fosse fundamentalmente atrelado ao perdão. Jesus aceitou o amor daquela mulher contra a rejeição dos justos que a achavam inaceitável. Tenho pra mim que nós seríamos muito mais igreja de Jesus Cristo se ficássemos sempre do lado dele, e não sempre do lado dos justos, como fazemos.

A única teologia válida para os pecadores é esta: Os teus pecados estão perdoados. Muitos sabem que eu não tenho o costume e nem a capacidade que muitos pastores tem de declarar isso ou aquilo sobre a vida de quem quer que seja. Mas isso, caro leitor, eu declaro sobre você e sobre a sua vida, e o faço com plena convicção. Teus pecados estão perdoados. Jesus morreu uma vez só, ele derramou seu sangue uma vez só, e é exatamente por isso que não precisamos esperar por mais nada, nem por mais ninguém. Aconteceu de repente com aquela mulher. Aconteceu na hora do seu desespero, da sua humilhação. De repente pode acontecer conosco também. A maravilhosa presença de Deus em nossas vidas mudando tudo de repente, como algo que nunca tinha acontecido na nossa vida, nós nos sentimos aceitos. Aceitos e amados. Aceitos, amados e perdoados, e é a partir daí o fogo do nosso amor nasce e começa a arder também. É uma experiência que não pode ser prevista, não pode ser fabricada, não pode ser falsificada. É por isso que não acontece com tanta frequência. Mas quando acontece, transforma tudo. Foi assim com aquela mulher na casa de Simão, o fariseu. Pode ser assim conosco também.

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