A conversão dentro da conversão II

Paulo em Athenas, Leonard Porter (1963-)
Poderíamos citar também o exemplo de Paulo e da sua segunda conversão após a sua pregação no Areópago narrada em Atos 17, começando a leitura a partir do versículo 19.
Aquele que é para muitos, inclusive para mim, simplesmente o melhor e mais objetivo sermão de toda a Bíblia, lhe foi mais profundo e transformador do que a sua experiência anterior na estrada de Damasco. Sobre este episódio da vida do apóstolo, a que costumamos conferir um valor extremo, o próprio Paulo poucas referências faz. Nem mesmo a tem como a mais sua experiência mais extraordinária, dando este crédito à outra, contada apenas quatorze anos após o seu acontecimento, e que está narrada em II Coríntios. Contudo, a sua controvérsia com os filósofos gregos no Areópago lhe rendeu muito maios frutos.

Um deles foi a elaboração da riquíssima doutrina sobre o valor genuíno da cruz de Cristo, em contrapartida aos pseudo valores deste mundo. A partir de então, a igreja passou a enxergar a cruz não mais como um castigo injustificado imposto por Deus ao seu Filho, mas como algo que relativiza qualquer outra doutrina formulada pela inteligência humana. Rendeu-lhe, a reboque, uma extraordinária e providencial transformação pessoal do exímio orador que costumava ser, em o apaixonado pregador que passou a ser, mudando completamente o foco da mensagem do evangelho, para que esta fosse dirigida, antes e mais objetivamente ao coração do que a razão. Para nós pregadores, enfim, rendeu uma infinidade de sermões sobre a incompreensível loucura da graça que prefere escolher o fraco, o vil e o louco antes das pessoas de prestígio, os fortes e os reconhecidamente sábios. Este também é mais um tapa na boca daqueles que exaltam a primeira conversão acima das conversões posteriores.

Seria injusto não citar as várias conversões de John Wesley à importância do trabalho da mulher na igreja, do valor da leitura para a preparação dos pastores, e até mesmo da sua anuência à consagração de administradores na nova colônia inglesa que havia se tornado independente. Mas eu queria ressaltar a sua conversão a permissão da pregação leiga em suas igrejas. Vejamos o que o rev. Fitchett fala sobre isso: Ainda depois de sua conversão Wesley possuía todas ou quase todas as prevenções do ritualista; e entre as mais obstinadas destas estava a sua prevenção contra a pregação leiga. Tocar neste ponto, como ele mesmo dizia, era tocar na menina dos olhos. Somente o clérigo devidamente ordenado ligado por uma corrente multissecular de ordenações até os próprios Apóstolos tinha o direito de se por no púlpito para pregar a seus semelhantes. Que um simples leigo ordenado por ninguém, subisse àquela sagrada eminência, ou ousasse interpretar com lábios seculares as Escrituras a seus semelhantes, para Wesley parecia nada menos do que um sacrilégio. Ele sentia ao contemplar tal espetáculo, como sentiria o sacerdote judeu se visse alguém que não fosse da tribo de Levi a ministrar ao altar. *

Vejamos agora o que nos diz o seu homônimo meu amigo citado anteriormente: Quando soube que havia um homem sem ordenação eclesiástica pregando na Fundição, ele mudou seus planos e, de Bristol, voltou incontinente para Londres para pôr fim a tal desordem. Quem evitou o atrito foi Susanna, mãe de Wesley, que lhe deu um sábio conselho: “Tem cuidado, João, com o que vai fazer daquele jovem, pois ele é certamente tão chamado para pregar como tu. Examina quais os frutos de sua pregação e, então, ouve-o tu mesmo”. Aceitando o conselho, ouviu Maxfield e afirmou: “É do Senhor, faça Ele como lhe aprouver” A partir daí, os leigos foram admitidos nas sociedades como pregadores.**

Faltaria tempo para falar da reconversão de Jó, de Pedro e de tantos outros que foram testemunhas vivas que o trabalho de Deus na primeira conversão é apenas um pequena mostra do quanto ele pode realmente fazer. O “nascer de novo” lega ao Cristianismo a certeza de que não existe absolutamente nada predeterminado ou definido. O Espírito de Deus está pronto e atento a nos mostrar as novas oportunidades que surgem vida vez que a situação se configura de modo diferente. Seria bom que a cada período de nossa vida fosse deixado como lembrança no passado e que pudéssemos sempre e cada vez mais repetir: Eu te conhecia só de ouvir, mas agora os meus olhos te veem.

*        Extraído do sermão “Os pregadores leigos: Uma nova ordem de auxiliares” do Rev. William Henry Fitchett.
**      Extraído do livro Pequena História do Povo Chamado Metodista de João Wesley Dornellas.

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