O que é IRA?

A ira do homem geralmente é reprovada pelas Escrituras. No Primeiro Testamento, sobretudo nos livros sapienciais: Pv 15.18 - O homem iracundo suscita contendas, mas o longânimo apazigua a luta. O motivo indicado muitas vezes é utilitarista; a ira é perigosa porque causa prejuízo.
Caim fugindo da ira de Deus, William Blake em 1809
Também a tradição hebraica condena a ira, pois o homem perde o domínio de si mesmo, e se deixa levar pela má paixão. Assim ele pode chegar a toda espécie de pecado, inclusive a idolatria. O Segundo Testamento também proíbe a ira, baseado no fato de que o amor a exclui: Ef 4.31 - Longe de vós, toda amargura, e cólera, e ira, e gritaria, e blasfêmias, e bem assim toda malícia.

Existe, contudo, uma ira santa, da qual o próprio Jesus deu exemplo: no modo como fala dos fariseus e na sua conduta com os cambistas do templo, assim como dirige um olhar irado a todos os que com hipocrisia contestavam o seu ministério: Mc 3.5 - Olhando-os ao redor, indignado e condoído com a dureza do seu coração, disse ao homem: Estende a mão. Estendeu-a, e a mão lhe foi restaurada.

Existe também um sentimento de Deus que se manifesta no seu juízo que é, através de um antropomorfismo exagerado, chamado de ira. A ira de Deus é a sua reação contra tudo que atenta contra a sua santidade e justiça. Normalmente descrita como uma paixão veemente, precisa descarregar-se e voltar à calma: Ez 16.43 - Visto que não te lembraste dos dias da tua mocidade e me provocaste à ira com tudo isto, eis que também eu farei recair sobre a tua cabeça o castigo do teu procedimento, diz o SENHOR Deus; e a todas as tuas abominações não acrescentarás esta depravação.

Como todos os povos da antiguidade, os hebreus atribuíam à ira de Deus todas as calamidades que os sobrevinham, mas ainda assim reconheciam que a ira do Deus de Israel não era um rompante de mau humor ou ciúme, como era comum aos deuses pagãos que não se importavam com a conduta humana. Para eles a ira de Deus poderia ser incompreensível, mas nunca satânica, pois, em última análise, era a revelação da justiça divina que condenava o pecado: Naum 1.6 - Quem pode suportar a sua indignação? E quem subsistirá diante do furor da sua ira? A sua cólera se derrama como fogo, e as rochas são por ele demolidas. Mantiveram sempre consigo a esperança de que no Dia do Senhor, que também era chamado pelos profetas de Dia da Ira, Deus se voltasse apenas contra os povos opressores de Israel, e que convertesse a ira em perdão para o povo.

No Segundo Testamento, a ira é um aspecto essencial para a compreensão de Deus. A pregação da misericórdia se junta à pregação sobre a ira. Só quem conhece a grandeza da ira de Deus pode avaliar a grandeza do seu amor misericordioso. Inspirando-se nos profetas, os autores do Segundo Testamento usam o termo ira geralmente no sentido escatológico. A ira provocada pela pecaminosa conduta da humanidade está guardada para os tempos da consumação: I Ts 1.10 - e para aguardardes dos céus o seu Filho, a quem ele ressuscitou dentre os mortos, Jesus, que nos livra da ira vindoura. Exponencialmente aumentado pela lei, o pecado trona-se ainda mais culpado, não restando alternativa ao homem, senão na graça de Deus: Rm 5.20 - A lei veio para aumentar o mal. Mas, onde aumentou o pecado, a graça de Deus aumentou muito mais ainda.

É pela reconciliação com Deus através de Cristo que escapamos à ira. O texto de João 3.18 - Aquele que crê no Filho não é julgado; mas quem não crê já está julgado porque não crê no Filho único de Deus, parece ser um simples jogo de palavras, é a explicação mais lógica do binômio ira-misericórdia. Na realidade, não é Deus quem está exercendo o julgamento, pelo contrário, através da entrega do seu Unigênito está colocando ao alcance de todos a sua misericórdia. Aquele que não a aceita, ou aquele que não leva é conta que é uma oferta gratuita, condena a si mesmo a viver em um mundo que desconhece a misericórdia, e onde a ira prevalece absoluta sobre todas as coisas.

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